Noutro dia, numa roda de amigos alguém perguntou: “como é mesmo aquela música do Renato Russo que diz – Ainda que eu falasse a língua dos homens, e falasse a língua dos anjos, sem amor eu nada seria?” Seguindo a conversa, ficamos surpresos, a princípio, em verificar que a pessoa não havia sido capaz de relacionar a letra desta estrofe da música com a Primeira Epístola aos Coríntios de Paulo de Tarso, um dos principais, senão o principal, difusor da Fé Cristã no século I, onde .m Corinto, uma das mais florescentes cidades gregas da antigüidade clássica, sobre a suprema excelência do Amor.
Em seguida nos demos conta, mais uma vez, que o Criador em sua incomensurável sabedoria, e porque não dizer Amor, nos deu outra prova de sua presença mesmo nos atos mais simples, e nós, em nossa vã ignorância e prepotência intelectual, insistimos em não reconhecer de plano.
Paulo de Tarso dizia naquela ocasião: “Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse Amor seria como o metal que soa ou como o cimbalo que retine.” Com efeito, se nossa matéria não estivesse impregnada de Amor seriamos como simples objetos emitentes de sons, pois não teríamos Alma, a “anima” dos gregos. Nossa Alma, que nos anima, é exatamente a centelha Divina, emanada de Deus, que nos habita e preenche de Amor. E reparem bem, Paulo de Tarso fala nas línguas dos homens e dos anjos. Será que ele quis dizer com isso que o Amor é a língua de Deus?
É claro que não falamos aqui do amor passional, carnal e humano, mas sim do Amor sublime, insondável e inefável que se faz presente em toda manifestação do Universo. Falamos do Amor que nos concede cada nascer e pôr do sol; que nos brinda com a exuberância da natureza; que nos emociona com um simples sorriso de uma criança. Falamos do Amor que independe de reciprocidade para existir, que se basta por si só, que nos envolve com tanta alegria e tranqüilidade quando o percebemos, que nos proporciona a sensação de bem estar e Paz Profunda. Falamos do sentimento que impulsiona os cientistas e filósofos a tentar traduzir as Leis Cósmicas para uma linguagem acessível a nossa limitada mente. Falamos do Amor que nos outorgou a maior dádiva que um ser vivente pode possuir: o Livre Arbítrio. Amor que é tão infinito e sábio que sequer se importa nas vezes em que duvidamos de sua existência. Este Amor é indestrutível e eterno.
O verdadeiro místico sabe que o Amor é a maior das “magias”, e que nenhum “feitiço” ou “encantamento” pode derrotá-lo, ou mesmo lhe atingir. O Amor é um verdadeiro “escudo místico”.
Sem dúvida, o Amor é a Linguagem Universal, pois não necessita de sequer uma palavra para se manifestar e ser sentido, e da mesma forma faz uso de todos os alfabetos, letras e línguas conhecidas para que possamos, amorosamente, tentar compreendê-lo. Este Amor não precisa de gestos, pois se manifesta plenamente através de nossa Aura e do simples olhar (não dizem que os olhos são o espelho da Alma?). Por vezes podemos senti-lo até nos animais.
Por isso tudo não havia razão para ficarmos surpresos. O Amor, mais uma vez, é que está certo, pois as palavras da canção não são de Paulo de Tarso, o Amor apenas fez dele seu arauto. Assim como ocorreu séculos depois com Renato Russo, que fez da música o instrumento para revelá-lo a uma platéia que talvez nunca tenha lido o Evangelho, nem por curiosidade… Mas mesmo assim o Amor se fez presente e encheu a canção com sua mensagem.
O texto da epístola, ainda que possivelmente distorcido por séculos de traduções, mantém sua essência, e pode ser facilmente encontrado em qualquer edição do Evangelho, ou na própria internet. Vale a pena perder, ou ganhar, alguns minutos lendo sua mensagem, independentemente de sua fé ou crença religiosa, pois estas são criações dos homens, mas a Sabedoria que leva à Verdade é um dom Divino. Como complemento você pode procurar identificá-lo nos textos das Escrituras Sagradas de outras correntes filosóficas, temos certeza que ele lá estará também.
À propósito, a música se chama “Monte Castelo”, e foi gravada pelo grupo “Legião Urbana” numa coletânea denominada “As Quatro Estações” em 1989, e além de trechos de Paulo de Tarso tem também a colaboração de Luís de Camões. Também vale a pena perder, ou como dissemos antes, ganhar um tempinho para ouvi-la.
Tomara, a exemplo da súplica de outro cristão: Francisco de Assis, que o Amor faça de cada um de nós, e a cada dia, um de seus arautos.
Sérgio Antonio Machado Emilião
Mestre Maçom e Frater R+C